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De 100 a 200 bilhões: qual o custo da PEC de Transição e o futuro fiscal do Brasil?

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Mercado tem lançado desconfiança sobre disciplina fiscal de governo eleito. Custos, porém, faziam parte de promessa de campanha de ambos os candidatos

(Pedro França / Agência Senado/Agência Senado)

Em agosto, o governo federal enviou ao Congresso o orçamento de 2023. Na peça, estimou um déficit na ordem de 63 bilhões de reais — cifra considerada conservadora — para acomodar novos gastos, incluindo a manutenção do auxílio brasil. E, no meio do caminho, havia uma eleição. As promessas eleitorais dos principais candidatos à presidência sedimentaram a percepção de que, no próximo ano, o teto de gastos será furado. As dúvidas são: em quanto e qual a nova âncora fiscal?

Com a anunciada PEC da Transição, a proposta de emenda à Constituição que permitiria gastar acima do teto de gastos, veio ao holofote a ideia de um “waiver”, isto é, uma licença para gastar. E recaiu a desconfiança do mercado sobre a disciplina fiscal do governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva. Nem o anúncio de nomes como André Lara Resende ou Pérsio Arida, pais do plano real, reduziram as suspeitas de um expansionismo fiscal agressivo.

“Ainda não está definido como vai ser [o programa], mas é esperado um bolsa familia de 600 reais (e 150 reais a mais por criança), aumentos para p programa de farmácia popular, merenda, e o aumento do salário mínimo”, diz o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale. “Quando a gente junta tudo isso, pode chegar a 80, 90 bilhões de reais.”

Some-se a isso, gastos com programas de habitação, como a revitalização do antigo Minha Casa Minha Vida. As estimativas de um “waiver” variam entre 100 e 200 bilhões de reais. O número estimado concreto será conhecido quando a PEC for apresentada — o que é esperado para amanhã, 9.

Para ter a tal licença, porém, é preciso clareza. “Eu acho que os 150 bilhões [de waiver] podem ser viabilizados. Vai depender de algumas coisas: primeiramente, o nome de um ministro da Fazenda que seja alinhado com a responsabilidade fiscal”, avalia Vale. “Além disso, o que vai ser a nova regra [no lugar do teto de gastos] a partir de 2024.”

Expoentes do mercado financeiro reagiram. Em carta nesta terça-feira, 8, Luis Stuhlberger, sócio-fundador da Verde Asset, disse ver “com preocupação as primeiras sinalizações e discussões fiscais” que a PEC da Transição está “se tornando (mais um) trem da alegria brasiliense de crescimento dos gastos descontrolado, e a mídia já fala de mais de duzentos bilhões de gastos, algo completamente descabido, para falar o mínimo”.

Palavras semelhantes foram utilizadas pelo ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, da Rio Bravo Investimentos. Em carta, ele avaliou haver “três bombas para incorporar no Orçamento: uma nova política de salário mínimo, o novo bolsa família permanente e aumentado e o aumento da faixa de isenção na tabela do IR”. “O orçamento já parecia meio impossível antes dessas promessas. O único atenuante para isso é a observação segundo a qual o orçamento no próximo ano sempre parece irreal logo antes do início do exercício fiscal, quando algum milagre sempre acontece, às vezes mais de um”, escreveu Franco.

O economista Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do FGV IBRE, divide o assunto em dois passos:  fazer a articulação para o próximo ano com o “waiver” e a discussão estruturante do novo regime fiscal e como ele seria desenvolvido a partir de 2023. “Estamos falando de um governo que não tomou posse, tem poucos instrumentos de barganha para resolver [a questão orçamentária]. Em termos de previsibilidade, se conseguir resolver já na transição, vejo com bons olhos”, avalia Pires.

No médio prazo, a discussão estrutural ganhará mais sentido com a indicação de um ministro, a apresentação de uma proposta e uma discussão com o Congresso Nacional. “O nome de um ministro indicado pode dar diretrizes sobre isso e diminuir a incerteza, mas, ainda assim, acredito que essa discussão só faz sentido no ano que vem. E depois virão o tema das reformas: como vai fazer reforma tributária, se vai fazer reforma administrativa, como vai mobilizar agenda de investimentos. Mas aí é mais quando toda equipe já tiver montada”, diz.

Em setembro, o boletim de macro, publicação mensal do Ibre/FGV, já alertava sobre a “possibilidade de um waiver fiscal no começo de 2023” para abarcar gastos públicos não incluídos na proposta orçamentária que havia sido enviada ao Congresso pelo governo Bolsonaro.

Programas como o Farmácia Popular vieram com corte de mais de 90%, enquanto o programa de livro didático sequer teve licitação prevista, inviabilizando os programas na prática. Assim, com qualquer governo eleito, um novo furo no teto de gastos para 2023 já era dado como certo entre quem acompanhava de perto o orçamento antes da eleição. “Há no orçamento hoje uma série de situações que não são razoáveis”, afirma Pires, sobre a falta de previsão orçamentária a programas já existentes.

Entre políticos,a licença para gastar é “necessária”, como disse o deputado Ricardo Barros (PP-PB), atual líder do governo Bolsonaro na Câmara. “É necessária, porque tanto Bolsonaro quanto Lula prometeram R$ 600 de Auxílio Brasil e ganho real do salário mínimo. Se prometeu, tem que entregar”, disse Barros.

Nesta terça-feira, o vice-presidente e coordenador da transição, Geraldo Alckmin (PSB), anunciou um núcleo de trabalho na frente econômica de transição com dois nomes mais ligados ao PT (Nelson Barbosa e Guilherme Mello) e dois vistos como liberais (Pérsio Arida e André Lara Rezende), além de uma frente social que inclui a senadora Simone Tebet (MDB). Na quarta-feira, 9, o mistério sobre o valor do limite para gastar pode acabar, pois é esperada a apresentação da PEC da Transição. Às 11h, o senador Marcelo Castro, relator do orçamento, Alckmin e o senador eleito, Wellington Dias, concederão entrevista coletiva. O mercado estará de ouvidos atentos.

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